Em meio à polêmica com o novo comercial da Havainas, estrelado por Fernanda Torres, as ações da Alpargatas, controladora da marca, registraram perda de R$ 200 milhões na Bolsa. A queda acontece em meio ao boicote de políticos brasileiros conservadores, que reprovaram a propaganda por, supostamente, conter uma indireta à direita do país. Nela, a atriz afirma aos espectadores que não deseja que eles comecem o ano com o “pé direito”.
— Desculpa, mas eu não quero que você comece 2026 com o pé direito. Não é nada contra a sorte, mas vamos combinar: sorte não depende de você, depende de sorte. O que eu desejo é que você comece o ano novo com os dois pés. Os dois pés na porta, os dois pés na estrada, os dois pés na jaca, os dois pés onde você quiser. Vai com tudo, de corpo e alma, da cabeça aos pés. Havaianas, todo mundo usa, todo mundo ama — diz Fernanda no comercial.
Por volta das 16h53 desta segunda-feira, as ações da calçadista (ALPA4) recuavam 2,56%, negociadas em R$ 11,42. Mais cedo, por volta das 16h20, os papéis chegaram a cair 3,41%.
O GLOBO procurou a Alpargatas, controladora da marca Havaianas, mas ainda não obteve resposta sobre a polêmica.
Depois da divulgação do comercial, políticos de direita pediram um boicote à marca. Cassado por ultrapassar o limite de faltas na Câmara dos Deputados, o ex-parlamentar Eduardo Bolsonaro jogou um par de chinelos no lixo para mostrar aos seguidores a indignação com a propaganda.
Pelas redes sociais, o filho do ex-presidente Jair Bolsonaro disse que vai começar o ano com o pé direito, mas não será de Havaianas.
— Eu achava que isso aqui era um símbolo nacional. Já vi muito gringo com essa bandeirinha do Brasil no pé, só que eu me enganei — disse Eduardo, antes de qualificar Fernanda Torres como alguém “declaradamente de esquerda”.
Já Nikolas fez um trocadilho com o slogan da marca. “Havaianas, nem todo mundo agora vai usar”, escreveu o deputado federal.
O senador por Minas Gerais Cleitinho Azevedo (Republicanos) também publicou vídeos em suas redes sociais comentando a propaganda. Ele afirmou que o pedido para não começar o ano “com o pé direito” funcionaria como uma metáfora.
“A gente sabe o recado que a Havaianas quis deixar aqui, até porque o ano que vem é um ano eleitoral e o país está extremamente polarizado. E quem ela contrata para poder fazer essa propaganda? Uma atriz que é declaradamente contra a direita, que faz várias entrevistas dizendo que é contra a direita, que subiu no trio elétrico agora para dizer que é contra anistia”, afirmou. A publicação é a mais visualizada entre os vídeos recentes do senador, com 2,8 milhões de visualizações e mais de 200 mil curtidas.
O empresário Luciano Hang, dono da rede Havan, também publicou conteúdo sobre o caso. Em postagem nas redes sociais, afirmou que, neste verão, passaria a usar apenas chinelos da marca Ipanema, principal concorrente da Havaianas.
Em 48 horas, o perfil da Ipanema no Instagram registrou um salto de mais de 490 mil novos seguidores.
Segundo o site InsTrack, que monitora estatísticas de páginas no Instagram, o @sandaliasipanema saiu de 510 mil seguidores no sábado (20) para 1 milhão na tarde desta segunda. A página também recebeu comentários de apoiadores da direita, muitos deles anunciando que pretendem trocar de marca.
O movimento nas redes, em especial, pressionou mais as ações, afirma Alison Correia, analista de investimentos e cofundador da Dom Investimentos. “Os investidores entenderam como uma indireta, em um momento já sensível ao considerar que o próximo ano que ela menciona [na propaganda] é um ano de eleições”, afirma.
Apoiadores da direita também passaram a comentar publicações da Ipanema no Instagram. A postagem mais recente da marca soma mais de 614 mil curtidas, número superior ao registrado em publicações anteriores, que costumavam variar entre 10 mil e 30 mil curtidas. Nos comentários, usuários dizem que começarão 2026 “com o pé direito” usando Ipanema e pedem para que a marca aproveite a “oportunidade” para vender.
No campo da esquerda, as críticas feitas por grupos da direita também geraram reação. A deputada federal Erika Hilton (PSOL) questionou nas redes sociais a tentativa de boicote à marca. “Como assim os bolsonaristas tão cancelando até as Havaianas? Será que não serve direito nos cascos deles?”, escreveu.
O vereador Pedro Rousseff (PT), sobrinho da ex-presidente Dilma Rousseff, também comentou o episódio. Em publicação no X, disse que apoiadores da direita passariam a usar tornozeleiras eletrônicas para deixar de usar chinelos da marca.
Além das manifestações de políticos, usuários passaram a compartilhar nas redes sociais imagens geradas por inteligência artificial e montagens de chinelos em formato de ferradura.
Com a proximidade do Natal, também surgiram comentários segundo os quais a repercussão negativa poderia, na prática, ampliar a visibilidade da marca, além de brincadeiras sobre presentear familiares alinhados à direita com produtos da Havaianas.


