• Dino dá recado ao Congresso e critica ‘democracia do piti’

    O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Flávio Dino criticou a “democracia do piti”, em meio a ataques de congressistas à sua decisão sobre as emendas parlamentares. Dino que a democracia não permite “chantagens e agressões”, em meio a uma disputa com o Congresso pela liberação das emendas parlamentares.

    “Como é que um Poder fica dando escândalo toda vez que o outro decide?”, questionou. “Já tinha visto democracia social, democracia liberal, mas democracia do piti nunca tinha visto.”

    A fala foi feita no evento STF em Ação, organizado pelo Ieja (Instituto de Estudos Jurídicos Aplicados), em Brasília.

    “Se um Poder está plenamente satisfeito, isso está errado. Alguém aqui está plenamente satisfeito com o seu cotidiano? Claro que não, Deus seja louvado”, disse Dino, acrescentando que as decisões relativas as emendas foram validadas pelos demais membros do Supremo.

    Sem citar diretamente o imbróglio, Dino disse que nenhum julgamento da corte é feito “sem diálogo com a sociedade”. “Seja emendas, orçamento, bets, regulação de internet, meio ambiente”, completou, na fala de abertura do Conselho de Desenvolvimento Econômico Social Sustentável, o Conselhão, promovido pelo governo Lula (PT) para ouvir membros da sociedade civil.

    A democracia, portanto, não é regime de supremacias individuais, não é regime em que chantagens e agressões devem fazer parte do dia a dia nas relações institucionais e sociais. Flávio Dino, no Conselhão

    Segundo ele, houve críticas à sua decisão da semana passada sobre emendas, sob o argumento de que ele desrespeitou a lei aprovada pelo Congresso.

    “Tudo o que está na decisão está na lei. Agora, se tem gente que votou e não sabe que votou, eu lamento. Está lá”, disse.

    Mais cedo, em outro evento, o ministro havia dito que o Judiciário não é um poder político e que nenhum julgamento ocorre sem participação popular. Ele afirmou ainda que as críticas de ativismo judicial é de quem foi contrariado por decisões da Corte.

    A declaração cita diretamente emendas parlamentares, que geraram crise após decisões do magistrado para aumentar a transparência e a rastreabilidade do envio dos recursos. A solução encontrada pelo governo, de editar uma portaria e emitir um parecer da AGU (Advocacia-Geral da União), gerou mal-estar entre aliados de Lula (PT) e Dino, como mostrou a Folha.

    “O Judiciário não é um Poder político, eleito, mas valoriza profundamente o poder popular, soberania popular, e a participação social. Por isso, promove sempre audiências públicas, sessões técnicas, há figura que todos conhecem das entidades que participam do julgamentos”, disse.

    “E nenhum julgamento relevante para o Brasil é feito no Supremo sem diálogo com a sociedade. Seja emendas, orçamento, bets, regulação de internet, meio ambiente”, completou.

    “Normalmente, essa crítica quanto ao ativismo [do STF] vem daqueles que não gostam da decisão do Supremo. O Supremo, quando decide, agrada alguém e desagrada alguém. Esse que é desagradado diz ‘o Supremo se mete em muita coisa”.
    Flávio Dino, no Conselhão

    Dino discursou no Conselhão, colegiado organizado pelo governo federal com a presença de integrantes do empresariado e da sociedade civil.

    Ele foi enviado pelo ministro Luís Roberto Barroso, presidente do STF, para representar a corte e receber manifesto da Comissão de Direitos e Democracia em Defesa das Instituições, do Judiciário e do Estado Democrático de Direito

    “A democracia não é regime em que os conflitos devem sempre falar mais alto, pelo contrário. Democracia exige construção de convergência, por isso mesmo não é regime em que um grita mais e impõe sua vontade”, afirmou.

    O ministro disse ainda que não é possível imaginar um Supremo intimidado e acovardado.

    “Democracia não é regime em que um Poder do Estado, qualquer que seja ele, está plenamente feliz, porque, se estiver, é sinal que alguém está infeliz, ou outro Poder do Estado, ou mais grave, a população”, disse.

    Sem citar diretamente o momento de mal-estar entre os Poderes em torno das emendas parlamentares, cuja liberação tem sido exigida no Congresso para dar seguimento à votação do pacote de corte de gastos do governo, Dino disse que quem fala em “ativismo judiciário” é porque ficou insatisfeito com decisão.

    “Normalmente, essa critica quanto ao ativismo, vem daqueles que não gostam da decisão do Supremo. O Supremo, quando decide, agrada alguém e desagrada alguém. Esse que é desagradado diz ‘o Supremo se mete em muita coisa'”, disse.

    “Mas, quando Supremo decide no sentido convergente com interesses A ou B, aí o Supremo está certo. Infelizmente não é esse tipo de debate que vai determinar conteúdo de uma decisão judicial. O Judiciário que fosse silenciado, amordaçado, só é possível nos regimes ditatoriais. O Judiciário tem funcionado de modo livre”, completou.

    Estavam na plateia ministros de estado, como Alexandre Padilha (Relações Institucionais) e Fernando Haddad (Fazenda).

    A contrariedade de integrantes do governo cresceu após Dino ter negado na segunda-feira (9) três pedidos feitos pela AGU (Advocacia-Geral da União) para facilitar o desbloqueio de mais de R$ 13 bilhões em emendas ainda não empenhadas.

    As emendas são uma forma pela qual deputados e senadores conseguem enviar dinheiro para obras e projetos em suas bases eleitorais e, com isso, ampliar seu capital político. A prioridade do Congresso tem sido atender seus redutos eleitorais, e não as localidades de maior demanda no país.

    Os pedidos do governo para o STF estavam alinhados com a cúpula do Congresso. Eles miravam o pagamento de emendas “Pix” e a identificação dos parlamentares autores originais das emendas de comissão.

    Com a negativa de Dino, o governo finalizou a portaria em menos de 24 horas. O texto pode abrir brechas para as emendas “Pix” enviadas para a área de saúde serem executadas sem a apresentação de planos de trabalho.

    A portaria ainda permite que as emendas de comissão sejam executadas quando “qualquer parlamentar” se identifique como solicitante da verba —sem garantias de que o congressista seja efetivamente o responsável pelo dinheiro.

    Uma resposta

    1. O ministro político pensa que engana quem? É claro que, quando o ministro/político, vai interpretar uma Lei, ele leva consigo todo a sua bagagem, os seus pensionamentos. Quem passou a vida inteira fazendo política jamais vai ficar neutro, pois, a isenção é mito para enganar os incautos. Como dizem os nobres, Lei é questão de hermenêutica. E, todos, sabemos que seu caso, V. Excia está passando apenas uma temporada para retornar ao mundo da política.

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