O presidente do Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde), Carlos Lula, defendeu o cancelamento de festas de virada do ano por parte dos municípios. A declaração foi feita na 3ª feira (7.dez.2021) em entrevista ao Poder360.
Eventos de ano novo tem sido cancelados no Brasil desde a descoberta da variante ômicron do coronavírus. Há indícios de que a cepa seja mais transmissível. “É melhor evitar o Réveillon, para podermos não tomar medida mais drástica no futuro“, declarou o presidente do Conass.
Assista à entrevista Carlos Lula ao Poder360 (18min34s):
Outra estratégia para combater a ômicron é a redução do intervalo para aplicar da dose de reforço. O Ministério da Saúde orienta que o período seja de 5 meses. São Paulo, Ceará, Maranhão, Pernambuco e Rio Grande do Norte determinaram que seja de 4 meses. O presidente do Conass avalia que mais Estados devem anunciar a medida. Afirmou haver doses para isso.
“Principalmente em relação ao Norte e Nordeste temos um período de síndrome respiratória no início do ano. É diferente do Sul e Sudeste”, declarou. Além de comandar o conselho, Carlos Lula também é secretário da Saúde do Maranhão, um dos Estados com picos de doenças respiratórias no início do ano. “Eu preciso ter a proteção da minha população nesse momento para que não tenhamos nenhum recrudescimento de casos“, disse.
Apesar da ômicron, o secretário disse que o Estado ainda não cogita voltar a exigir máscaras ao ar livre. “Mas avaliamos a medida semana a semana. A qualquer indicador de aumento de casos, voltaremos atrás”.
Por causa da descoberta da variante na África, continente com baixa cobertura vacinal, ele também defendeu a importância de doar doses para outros países.
Afirmou que a doação precisa partir do governo federal, por causa deste ser o ente responsável pelas negociações diplomáticas. “Aparentemente, o ministério quer fazer esse gesto. Segundo me foi relatado, estaria sendo minutada a Medida Provisória para essa finalidade”, declarou. Segundo ele, caso o governo não faça a doação, os próprios Estados agiriam.
Disse que municípios estão devolvendo vacinas “porque já não encontram pessoas que queiram ser vacinadas”. Seria um “equívoco” deixá-las vencer. “O mundo precisando de vacinação e deixarmos vacinas perderem a validade no país”.
O presidente do Conass ainda disse que os percentuais menores de vacinação em alguns Estados se devem falta de acesso à internet. “Tem um delay, sobretudo no Nordeste, porque há muitas Prefeituras que não possuem internet e a ficha da vacinação é feita à mão e só depois registrada no sistema do Ministério da Saúde”, disse.
Leia a entrevista de Carlos Lula ao Poder360:
Poder360: A indícios de que a variante recém-descoberta do coronavírus, a ômicron, seja mais transmissível e tenha maior resistência à resposta imune. O que os estados precisam fazer para combatê-la?
Carlos Lula: Esse é um momento de cautela. Não podemos nos desesperar com a ômicron, mas também não podemos achar que nada vai acontecer. A pandemia já demonstrou que não podemos simplesmente achar que ela passou.
Além do aumentar a vigilância genômica, devemos adotar medidas sanitárias de restrição de pessoas que cheguem ao Brasil.
Há duas medidas que temos que tomar com velocidade: aumentar a 3ª dose e fazer doação de vacinas para os países que estão precisando.
Temos vacinas hoje que são devolvidas pelos municípios aos Estados. Sobretudo de vacinas da CoronaVac. Não se está falando de falta de vacina no país. Pelo contrário, a gente tem mais de 100 milhões de doses contratados e municípios devolvendo vacina porque já não encontram pessoas a quem vacinar ou que queiram ser vacinadas.
Seria possível os próprios Estados doarem essas doses?
Temos um problema nesse ponto porque as relações internacionais são de competência da União.
Aparentemente, o ministério quer fazer esse gesto. Segundo me foi relatado, estaria sendo minutada a Medida Provisória para essa finalidade. Publicamente ainda não houve essa fala.
Se isso não acontecer, acredito que essa possa ser uma decisão dos Estados. Não podemos perder a validade das vacinas. Seria um equívoco sem tamanho. O mundo precisando de vacinação e deixarmos vacinas perderem a validade no país.
Em relação ao uso de máscaras, vimos São Paulo voltando atrás e adiando o momento de flexibilização da proteção. O Maranhão também pensa em voltar a exigir as máscaras em locais abertos?
É muito improvável contaminação em locais abertos, ainda mais se ele for ventilado. Mas avaliamos a medida semana a semana. A qualquer indicador de aumento de casos, voltaremos atrás. Essas medidas precisam ser reavaliadas. Quando decidimos ainda não tinha a ômicron.
Mas mesmo com o fim da obrigatoriedade, as pessoas não deixaram de usar máscara no Maranhão. Isso é ótimo. Entendemos que as pessoas compreenderam que a utilização é uma maneira eficaz e barata de se conter a pandemia.
São Paulo reduziu o intervalo para a dose de reforço de 5 meses para 4. Outros estados tendem a seguir essa decisão?
Pernambuco já havia feito, São Paulo e Maranhão também fizeram. Acredito que outros Estados o farão. Porque há doses disponíveis para isso. Tínhamos pedido ao Ministério. É sempre melhor adotar as medidas em conjunto do que cada Estado de maneira isolada.
Principalmente em relação ao Norte e Nordeste temos um período de síndrome respiratória no início do ano. As chuvas iniciam no final do ano. É diferente do Sul e Sudeste. O pico de síndrome respiratória no Norte e Nordeste é em março e abril. Então, eu preciso ter a proteção da minha população nesse momento para que não tenhamos nenhum recrudescimento de casos. É muito provável que Estados do Norte e Nordeste diminuam o intervalo de dose para 4 meses nos próximos dias.
Enquanto alguns Estados não chegaram a metade da população com duas doses, outros já vacinaram mais de 70% dos habitantes. Quais os riscos disso e o que é necessário fazer para contornar essa desigualdade?
A gente tem uma desigualdade muito grande e ela deriva das desigualdades sociais. É muito mais difícil vacinar a população do interior do Maranhão do que eu vacinar a população do interior de Santa Catarina.
Tem inclusive um delay, sobretudo entre os estados do Nordeste. Praticamente todos eles vacinaram menos que a média brasileira porque há muitas Prefeituras não possuem internet e a ficha da vacinação é feita à mão, depois é registrada para subir no sistema do Ministério da Saúde. Acredito, por exemplo, que no Maranhão tem mais ou menos 500 mil fichas a digitar. Isso é tão grave quanto não vacinar. Por quê? Porque eu não consigo ter a dimensão real disso.
E falando sobre a atuação do Ministério da Saúde, o ministro Marcelo Queiroga já criticou algumas vezes os Estados por não seguirem o PNI (Programa Nacional de Imunizações). O senhor avalia que os Estados não seguiram essas orientações e que tomaram medidas próprias por quais motivos?
O Ministério perdeu sua capacidade de coordenar. Se eu não tenho segurança em quem fala. O ministério se desmoralizou ao longo da pandemia. Não tem como resgatar essa autoridade pela força. Se o ministério continua dando mau exemplo, ele não tem como querer coordenar qualquer coisa.
Uma das críticas sobre o Ministério da Saúde é por este não ter divulgado ainda o calendário de distribuição de doses para 2022. Qual o problema disso?
A gente pede esse calendário de distribuição de doses desde outubro. E me parece ser possível divulgar porque o Ministério tem contrato. Eu não sei dizer a razão pela qual ainda não foi divulgado. Porque haverá doses disponíveis.
E há receio de que falte essas doses?
Não. O que temos de cronograma de compra de doses é suficiente pra abastecer em 2022 e termos condição de fazer a 3ª dose na maior parte da população.
A Europa vive agora uma nova onda covid-19. Até Portugal, que tem quase 90% da população com duas doses, passa por uma alta de casos. Qual a chance do Brasil ter um novo surto e o que podemos fazer para evitá-lo?
Sempre há chances. Aqui todos os cenários da Europa sempre aconteceram com 3 meses de atraso.
Talvez a Europa esteja nesse momento sofrendo o fruto da sua boa resposta na pandemia. Por quê? Porque lá há um número muito grande de não infectados. São pessoas que não adoeceram. Então se em muitos países há um número considerável de pessoas que não querem tomar a vacina mais o número considerável de pessoas que não adoeceram, óbvio que há um espaço muito grande para o vírus circular. Como no Brasil há muitos infectados e vacinados, há pouco espaço de circulação do vírus.
Em Portugal, apesar de haver aumento de casos, não há aumento grande no número de óbitos, o que confirma que a vacina dá certo.
O que sabemos sobre a ômicron? Vamos ter que esperar os próximos dias para olhar esse comportamento. Qualquer um que trace cenário vai estar sendo falso. Temos que aguardar entre 7 e 10 dias para ter os primeiros resultados das pesquisas e começar a entender o comportamento dessa variante.
Então por enquanto o senhor avalia que é possível continuar com as medidas de flexibilização das restrições?
Já tem muita gente voltando atrás nessas medidas. Inclusive em relação ao réveillon. Era para termos posição do Ministério em relação ao tema.
Adotamos no Brasil uma política de redução de danos. Se fosse ter uma política só sanitária, eu colocaria todo mundo em casa até hoje. Isso é completamente inviável do ponto de vista social. Tentamos então conviver com o vírus. Mas tem que conviver sem colocar as pessoas em risco de vida. Vamos vacinar, usar máscara, tentar manter distanciamento, tentar evitar um réveillon com 100 mil pessoas num local só. São essas medidas que precisamos estar revendo o tempo. É melhor evitar o Réveillon, para podermos não tomar medida mais drástica no futuro.