• Facções criminosas PCC e CV rompem trégua e voltam a declarar guerra

    Marcola, do PCC, e Marcinho VP, do CV — Foto: Fotos de arquivo

    As facções Primeiro Comando da Capital (PCC) e Comando Vermelho (CV) romperam a aliança anunciada em fevereiro, que tinha o objetivo de cessar as mortes entre os grupos, reduzir os custos com a guerra e garantir a continuidade dos negócios ilegais. A informação foi confirmada pelo Ministério Público de São Paulo ao GLOBO, que também teve acesso a diversos comunicados do crime, os chamados salves. O principal motivo para a ruptura, segundo autoridades que investigam as facções, são rixas regionais — que acabaram inviabilizando o acordo costurado pelos chefões presos.

    Os informes das facções são datados de segunda-feira (28). Ao contrário de quando anunciaram a trégua – com um texto assinado de forma conjunta -, os novos salves são individuais. Em uma das notas, intitulada como “comunicado geral” e com data dessa segunda-feira (28/4), o PCC bateu o martelo e escreveu que “chegou ao fim nossa aliança e qualquer compromisso com o Comando Vermelho”.

    O PCC afirma que, a partir desta data, chega ao fim a aliança, e informa que o armistício tinha o objetivo de diminuir homicídios, que atrapalhavam os negócios. O comunicado também expõe que o acordo foi rompido por “questões que ferem a ética do crime”.

    Em uma “circular informativa” encaminhada por meio das redes sociais, com assunto “Ruptura de Aliança com o PCC e Reforço de Diretrizes Internas”, o Comando Vermelho informou que, a partir daquele dia, segunda-feira (28/4), não manteria mais qualquer aliança ou compromisso com o PCC.

    O CV também comunicou sobre a ruptura e alertou seus integrantes sobre homicídios de inocentes, citando as recentes mortes de jovens que fizeram sinais atribuídos às facções com as mãos – de um ano para cá, foram muitos os casos de mortos ou torturados em diferentes estados do país por postarem fotos com gestos de três dedos, uma alusão ao PCC, e dois dedos (o V de vitória ou paz e amor), símbolo do CV.

    A ruptura foi confirmada ao GLOBO pelo promotor de Justiça Lincoln Gakiya, do Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado (Gaeco), do Ministério Público de Presidente Prudente, no interior do estado. Jurado de morte pelo PCC, Gakiya atua há quase duas décadas contra a facção.

    — Acho que isso era até esperado. Não imaginava que [a trégua] fosse perdurar. A informação que tive conhecimento, já há algum tempo, é de que o Marcinho VP [principal líder do CV] não teria dado aval para essa trégua. E o aval dele seria indispensável. Isso pode ter levado a esse rompimento — destaca Gakiya.

    Segundo ele, nenhum dos lados quer abrir mão dos espaços que ocupam. O promotor também pontuou que as facções têm perfis organizacionais que divergem, o que também dificulta a implementação da trégua. O promotor ressaltou, ainda, que era até esperado que a trégua durasse pouco tempo. “A informação que tive conhecimento, já há algum tempo, é de que o Marcinho VP não teria dado aval para essa trégua, o que seria indispensável”, completou.

    Como mostrou o GLOBO, Márcio dos Santos Nepomuceno, o Marcinho VP, havia negado “de forma veemente” a existência de uma trégua com o PCC, de acordo com relatório de inteligência da Secretaria Nacional de Políticas Penais (Senappen). O documento é do dia 22 de fevereiro.

    Ao ser informado por sua defesa sobre as notícias veiculadas nas últimas semanas a respeito do suposto armistício, Marcinho VP classificou as informações como “fake news”, diz o relatório. Marcinho VP teria argumentado ainda que mantém “uma postura de respeito” frente ao PCC pelo fato de terem lideranças no mesmo sistema prisional. “Mas reiterou que as facções permanecem como inimigas”, segundo o documento.

    Gakiya atribui o rompimento também à dificuldade de implementação da trégua em facções com perfis organizacionais tão diferentes. Enquanto o PCC tem uma direção única, com estados devendo satisfação à cúpula, o CV atua em esquema de franquias nos estados, com lideranças locais com mais autonomia. Autoridades que investigam as facções alegam que rixas locais e a perspectiva de crescimento do CV em alguns estados foram os principais motivos que levaram à ruptura.

    — Em suma, interesses territoriais de disputa por tráfico é o que leva a esse rompimento. Porque ninguém quer abrir mão do seu espaço — afirma o promotor.

    Sinais da trégua

    No fim de fevereiro, nove estados brasileiros afirmaram ter identificado “sinais concretos” da suposta trégua entre as facções criminosas, segundo relatório de inteligência da Secretaria de Segurança Pública de São Paulo.

    Os dados foram coletados pelo governo paulista junto às inteligências das Polícias Militares de 26 estados e do Distrito Federal. Perguntados sobre a existência da suposta aliança entre as facções até então rivais, nove deles confirmaram a informação: Minas Gerais, Amazonas, Acre, Roraima, Ceará, Piauí, Rio Grande do Norte, Alagoas e Sergipe.

    Além desses, outros nove estados afirmaram não ter dados suficientes para endossar a existência do armistício, diz o documento. Em três deles, ainda há indícios de que a organização criminosa paulista permanece em guerra com a fluminense. Cinco estados não retornaram.

    Os estados com evidências da aliança estavam essencialmente nas regiões Norte (3) e Nordeste (5). Minas Gerais era o único de outra região do país que reportou a trégua.

    Em apenas três estados do Nordeste não havia sinais concretos da conciliação. São Paulo, Rio Grande do Sul e Paraíba sustentaram a manutenção da rivalidade entre os grupos.

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