O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), deve conversar nas próximas horas com o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), para tratar da decisão do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), de suspender a execução de todas as emendas impositivas.
Em reunião na noite desta quarta-feira, 14, Lira e líderes partidários falaram em recorrer à Corte para tentar derrubar a determinação do magistrado, mas querem o apoio de Pacheco.
Segundo lideranças da Câmara, o clima na reunião com Lira foi de “indignação” com o STF. Após a decisão de Dino, o Congresso iniciou um movimento de retaliação. O primeiro ato foi rejeitar na Comissão Mista de Orçamento (CMO) uma Medida Provisória que previa uma recomposição orçamentária de R$ 1,3 bilhão para o Poder Judiciário e o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). O parecer pela derrubada da MP deve ser votada nesta quinta-feira, 15, no plenário da Câmara.
O plenário da Câmara votará nesta sexta a rejeição da MP que garantiria R$ 1,35 bilhão para recompor o orçamento de 7 órgãos do Judiciário e do CNMP (Conselho Nacional do Ministério Público). Deste montante, R$ 6,6 milhões iriam para o STF.
Em outra medida decorrente da decisão de Dino, a Câmara adiou, nesta quinta, a votação dos destaques (propostas de alteração) da segunda etapa da regulamentação da Reforma Tributária. Líderes partidários disseram ver clima desfavorável para concluir a votação da proposta após a decisão do ministro do STF.
Dino suspendeu nesta quarta-feira todas as emendas impositivas de parlamentares ao Orçamento da União até que o Legislativo crie regras para a execução desses recursos que observem requisitos de transparência, rastreabilidade e eficiência. A decisão de Dino vale até que o Congresso aprove novas regras para a liberação desses recursos, levando em conta critérios de “transparência, rastreabilidade e eficiência”. A determinação do ministro, uma liminar, ainda será submetida à análise dos demais ministros da Corte.
Deputados e senadores chegaram a prever para hoje a votação de mudanças nas chamadas emendas Pix para dar mais transparência nos repasses. A análise ocorreria na CMO, mas o item foi retirado de pauta para a inclusão da MP do Judiciário que acabou sendo rejeitada.
O Congresso foi pego de surpresa e agora os parlamentares querem se debruçar sobre a nova decisão de Dino para avaliar os desdobramentos. Até então, o ministro havia suspendido apenas a operação das emendas pix, que são uma parte das emendas individuais. A nova decisão, contudo, afeta todas as individuais e também as emendas de bancada estadual. Dino já havia pedido mais transparência nas emendas de comissão, que não são impositivas.
A ideia é delimitar o objeto das emendas Pix, ou seja, explicitar para qual fim o dinheiro está sendo usado (para qual obra ou política pública específica). Hoje, não fica claro como as prefeituras estão usando as verbas, embora o nome do deputado que enviou a emenda possa ser identificado.
Na sentença, Dino ordena, contudo, que não serão represados os recursos destinados a obras já iniciadas e em andamento ou de ações em casos de calamidade pública.
Emendas impositivas são recursos indicados por parlamentares com pagamento obrigatório pelo governo. Faz parte dessa fatia do Orçamento as chamadas emendas pix, que são enviadas diretamente ao caixa de estados e municípios, mas sem um fim específico, como uma obra ou desenvolvimento de política pública.
Também são afetadas pela decisão as emendas individuais que possuem destinação carimbada; e as emendas de bancada, indicadas coletivamente por parlamentares de um mesmo estado.
Dino considerou incompatível com a Constituição a execução de emendas ao Orçamento que não obedeçam a critérios técnicos de eficiência, transparência e rastreabilidade. O ministro frisou que as emendas parlamentares impositivas devem ser executadas nos termos e “nos limites da ordem jurídica”, e não ficar sob a liberdade absoluta do parlamentar autor da emenda.
Governo tenta se desvincular
Integrantes do governo demonstraram preocupação com a escalada da crise com o Congresso por causa da decisão do ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), de suspender o pagamento de todas as emendas de parlamentares. A estratégia, até aqui, é tentar se desvincular da decisão do magistrado. Dino foi ministro da Justiça do presidente Luiz Inácio Lula da Silva até fevereiro deste ano antes de ser indicado para o STF pelo petista.
Na quarta-feira, após a decisão de Dino, a reação foi imediata: na Câmara, foi adiada a votação de destaques da regulamentação da reforma tributária, pauta prioritária do ministro da Fazenda, Fernando Haddad. O cancelamento foi interpretado como um “recado” a Dino.
Logo depois, a Comissão Mista de Orçamento (CMO) do Congresso rejeitou uma Medida Provisória (MP) que prevê um aumento no orçamento do Poder Judiciário.
O ministro da Casa Civil, Rui Costa, chegou a dialogar nesta semana com líderes e o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), sobre as emendas.
— A mesma surpresa que o Legislativo teve, o governo também teve — afirmou o líder do governo Congresso, Randolfe Rodrigues (PT-AP).
Indagado sobre o fato de os parlamentares enxergarem o dedo do governo na decisão de Dino, Randolfe disse que se fosse da oposição também tentaria fazer o vínculo. Argumentou ainda que há votações de interesse do governo ocorrendo nesta semana no Congresso e, por isso, seria uma “insensatez” tentar conturbar o ambiente.
— Isso é o papel da oposição. Se eu fosse eles, também tentaria incendiar esse cenário.
No começo da noite de quarta-feira, horas depois da decisão, Randolfe e os ministros Alexandre Padilha (Relações Institucionais) e Jorge Messias (Advocacia-Geral da União) fizeram uma reunião informal sobre o assunto em um clube de Brasília. O trio havia participado da cerimônia de entrega da ordem do mérito da AGU.
Em um canto do salão onde ocorreu o evento, uma advogada da AGU leu para Padilha, Messias e Randolfe trechos da decisão de Dino.
Integrantes da equipe de articulação política do governo afirmaram que pretendiam estudar a decisão para avaliar os caminhos que devem ser seguidos para evitar uma crise com o Congresso.
No governo, a avaliação é que será necessário dar mais transparência às emendas pix (que preveem transferência direta a municípios sem indicação do projeto que receberá os recursos).
A transformação das demais modalidades de emendas em emendas individuais impositivas não é bem vista porque eliminaria um dos poucos mecanismos de organização da base ainda nas mãos do governo.