Por Malu Gaspar e Mariana Carneiro
Há uma razão bastante concreta para a agitação que tomou conta dos caciques do PL desde a reunião em que Valdemar da Costa Neto sacou dos dirigentes estaduais a tal “carta branca” para filiar Jair Bolsonaro ao partido.
Segundo interlocutores do presidente da República e do presidente do PL, o compromisso assumido por Valdemar após o estresse que adiou a filiação de Bolsonaro por alguns dias foi o de que o partido não fará alianças formais nos estados em 2022 com adversários de Bolsonaro nas eleições de 2022.
Embora o compromisso não tenha sido comunicado dessa forma explícita na reunião dos caciques do PL, a mensagem foi plenamente compreendida pelos líderes do partido, e confirmado por aliados de Valdemar a bolsonaristas em conversas pessoais e telefônicas logo depois do encontro de quarta-feira em Brasília.
Na reunião, Valdemar ressaltou que pela primeira em décadas o partido terá um candidato próprio à presidência – o último foi Guilherme Afif Domingos, em 1989. E que isso representaria uma oportunidade única de tornar o PL o maior partido do Congresso Nacional.
Assim, não faria sentido partir para uma campanha em 2022 com candidatos nos estados aliados ao PT – como vinha sendo planejado no Nordeste – ou com políticos da órbita de João Doria, como o vice-governador e pré-candidato Rodrigo Garcia (PSDB) em São Paulo.
Ter um candidato forte a governador no estado de Doria, aliás, é considerado fundamental por Bolsonaro. O preferido do presidente é o ministro da Infraestrutura Tarcísio de Freitas, que no último Datafolha apareceu com 4% de intenção de votos na pesquisa estimulada.
Tarcísio prefere ser candidato ao Senado por Goiás, onde avalia ter mais chances, mas já foi avisado por Bolsonaro de que talvez tenha que ir “para o sacrifício” em São Paulo. Embora Valdemar e Tarcísio sejam adversários políticos, ambos já dizem nos bastidores que suas diferenças não são irreconciliáveis.
O ministro demitiu filiados ao PL do Ministério da Infraestrutura, que já foi feudo do partido nos governos do PT. Valdemar também é contra a privatização dos aeroportos de Santos Dumont e Congonhas, parte dos planos de Tarcísio para 2022. Até fechar o acordo com Bolsonaro, o adjetivo mais comum que o presidente do PL dedicava ao ministro era o de “vagabundo”.
Os casos de São Paulo e de outros estados demonstram que o compromisso de Valdemar com Bolsonaro pode durar pouco. Caso queira manter o combinado com o presidente, Valdemar terá que debelar vários focos de revolta que já começaram a surgir no PL. Além de São Paulo, onde os 40 prefeitos e seis deputados estaduais do partido já têm um acordo para apoiar Rodrigo Garcia, o PL também já estava avançado nas alianças com o PT no Piauí, por exemplo, e com o DEM na Bahia. “Essas alianças terão de ser revistas”, diz um interlocutor de Bolsonaro.
Em São Paulo, Valdemar ainda considera manter Garcia como candidato, mas precisa acomodar os interesses do presidente. Uma alternativa seria Garcia ir para o PL, o que aliados do vice-governador dizem ser “improvável, senão impossível”.
Nos estados onde não há aliança formal nem com PT nem com Doria, os líderes locais já arrancaram de Valdemar a promessa de que poderão seguir com seus planos de coligações regionais. Mesmo que isso signifique ignorar os interesses do bolsonarismo.
Em Goiás, por exemplo, apesar do desejo já expressado pelo deputado federal Major Vitor Hugo, que é líder do governo Bolsonaro na Câmara, em disputar a vaga de governador, o PL afirma que deve lançar nome próprio, o do prefeito de Aparecida de Goiás, Gustavo Mendanha.
“Vitor Hugo é bem-vindo como deputado, mas seu nome não aparece nas pesquisas para governador. Não vejo problema em Bolsonaro apoiar um nome do PL que tenha mais chances aqui em Goiás”, diz a deputada Magda Mofatto, que dirige a sigla no estado.
Segundo ela, na reunião dos dirigentes regionais do partido em Brasília, todos se comprometeram em remodelar as estruturas locais para se adequar à base de apoio a Bolsonaro. Mas a avaliação de quais serão os candidatos dependerá também da evolução nas pesquisas.
“Em Pernambuco, o Anderson Ferreira está muito bem. Tenho certeza de que Bolsonaro acabará pedindo votos para o candidato mais forte”, afirma ela. O presidente já indicou que preferia ver o ministro do Turismo, Gilson Machado, na vaga. Nesse caso, uma solução possível seria Machado sair candidato ao Senado.
No Pará, o PL não abre mão de apoiar o MDB do governador Hélder Barbalho, que é rival de Bolsonaro e protagonizou embates públicos com o presidente durante a pandemia. O dirigente do partido no estado, o deputado federal Cristiano Vale, disse que a aliança vem desde 2014 e foi feita com a aprovação de Valdemar.
Vale já sabe que Barbalho não vai oferecer palanque para Bolsonaro no estado, mas diz não ver problemas na aliança. “Não vejo dificuldade nenhuma, o governador já disse que não quer nacionalizar a eleição”, disse.
Vale resumiu o espírito que tomou conta do PL depois da “carta branca” a Valdemar: “Eu acho que o que acontece aqui no Pará se repete em outros estados. Há os bolsonaristas radicais e os bolsonaristas mais moderados. Podemos trabalhar com estes últimos e entrar na bolha deles”, acrescentou. “A coisa não pode ser boa só para um lado. O PL é base do governo, ajuda em votações importantes. O apoio não se dá só na conversa, mas em ações. Não pode ser bom só para o Bolsonaro. É nisso que o Valdemar tem autonomia para fazer as tratativas com o presidente”, diz Vale.