A conversa em que Lula demitiu Jean Paul Prates da presidência da Petrobras, na noite dessa terça-feira (14/5), foi bastante dura, tanto para o presidente quanto para o ex-senador petista. O encontro no gabinete de Lula no Planalto durou cerca de 20 minutos, foi acompanhado pelos ministros Rui Costa, da Casa Civil, e Alexandre Silveira, das Minas e Energia, e, nas palavras de um interlocutor de Lula, foi “uma das mais difíceis que o petista teve neste governo”. Para Prates não foi muito diferente. Conforme ele comentou ao longo da noite de ontem com diferentes interlocutores, a sensação foi de que foi “humilhado” por Lula.
Lula estava constrangido com a situação. Não explicou a Prates por que Rui Costa e Alexandre Silveira, que tentam desde o ano passado tirá-lo da Petrobras, estavam na reunião. O presidente havia convocado Costa e Silveira poucas horas antes, cedendo a uma pressão que ambos exerciam há meses pela demissão de Prates, sob a alegação de que ele não entregava os resultados de que o país precisa na Petrobras.
Lula não comunicou outros ministros de seu círculo mais restrito de confiança, como Fernando Haddad e Alexandre Padilha, de que a demissão seria ontem. Poucas horas antes, ambos não sabiam de nada. A decisão de demitir Prates estava tomada há semanas, mas a decisão de comunicar Prates daquela maneira sobre a saída passou essencialmente pelo trio que agora, ao lado de Lula, recebia um espantado presidente da Petrobras, pego de surpresa com a presença de seus algozes.
“Eu e você temos visões diferentes sobre a Petrobras”
Lula foi direto e, assim que Prates entrou, disse que havia decidido substituí-lo. “Eu e você temos visões diferentes sobre a importância que a Petrobras tem para o Brasil”, disse Lula, evitando encarar Prates.
“Presidente, desta vez eu vou me permitir discordar do senhor. Das outras vezes em que eu vim aqui e o senhor me apresentou argumentos que chegavam ao senhor contra mim, eu discordava daqueles argumentos. Mas, agora que o senhor disse isso, a discordância é diretamente do senhor”, começou Prates. Lula ouvia calado e assim permaneceu. O agora ex-presidente da Petrobras prosseguiu.
“Quem escreveu cada linha do seu programa de governo na eleição de 2022, nas áreas de energia, petróleo, indústria naval, fui eu. Escrevi baseado em tudo que o senhor ensinou ao longo do tempo, mas aquelas linhas foram redigidas por mim. Como eu não poderia ter a mesma visão do senhor?”, rebateu. Lula, Rui Costa e Alexandre Silveira ficaram calados.
De fato, Prates fez, ao longo da campanha de 2022, dezenas de encontros, grande parte no segundo turno, em São Paulo e no Rio Janeiro, em que prometia a operadores do mercado, agentes de fundos e especialistas que a Petrobras do governo Lula 3 seria do diálogo, ouviria os diferentes segmentos envolvidos com a empresa e não perseguiria acionistas privados.
“Sua decisão me pareceu uma afronta”
Lula disse na sequência que a crise da distribuição dos dividendos da Petrobras, em março, havia sido um ponto relevante para a demissão. “A sua decisão de se abster na questão dos dividendos me pareceu uma afronta”, afirmou.
Na ocasião, após a publicação dos resultados financeiros de 2023, representantes da União no Conselho não aprovaram a proposta original de distribuição de dividendos e determinaram que não distribuíssem dividendos extraordinários referentes ao quarto trimestre de 2023. Prates se absteve na ocasião, o que foi usado por Alexandre Silveira e Rui Costa para desgastá-lo junto a Lula.
Novamente, nessa terça-feira, Prates rebateu a frase do presidente. “Como eu expliquei para o senhor, de maneira alguma foi uma afronta. Jamais afrontaria o senhor”, afirmou, explicando na sequência que a decisão de não votar com a União seguiu uma recomendação técnica, com o objetivo de não deixar morrer a proposta da diretoria executiva, de quem ele, como presidente da empresa, é o representante no conselho.
“Da outra vez, com o Mercadante, vazou tudo”
Lula explicou na sequência por que decidira não antecipar nada sobre a demissão. Segundo interlocutores de Prates, de fato, ele foi pego de surpresa ontem. Embora soubesse que estava há semanas por um fio, o ex-senador comentou com algumas pessoas para quem telefonou ontem que não esperava que a conversa fosse para demiti-lo. Lula foi claro sobre o porquê do sigilo. “Da outra vez, com o Mercadante, vazou tudo”. Em abril, Lula chamou Aloizio Mercadante e o sondou sobre a possibilidade de o ex-ministro assumir a estatal. O presidente do BNDES respondeu a Lula que conversaria com Jean Paul Prates. Saiu da reunião com Lula e telefonou para Prates, relatando a conversa com o presidente e a sondagem. Horas depois, quando o interesse de Lula em nomear Mercadante foi noticiado na imprensa, o presidente irritou-se e recuou da decisão de movê-lo do banco para a estatal.
“Quero lhe agradecer, mas preciso sair para cuidar da minha vida”
A essa altura, o clima era horrível. Lula não encarava Jean Paul Prates. Rui Costa e Alexandre Silveira observavam calados, sem sorrir, mas tampouco tentaram tornar a demissão menos dura para Prates. Foi este quem decidiu encerrar a conversa. “Presidente, o meu chefe de gabinete que está comigo aqui fora vai tratar com o Rui [Costa] sobre a minha saída. Quero lhe agradecer, mas preciso sair para cuidar da minha vida. Tenho que desmontar minha casa no Rio e tomar diversas providências. Obrigado”. Os quatro se levantaram quase ao mesmo tempo, Prates cumprimentou Lula, deu as costas aos três e saiu de cabeça baixa. (Metrópoles)