• Desembarque do PP do Planalto esbarra em Fufuca e cargos como o comando da Caixa e no longo histórico governista da sigla

    Mesmo após o início da discussão interna do PP sobre um eventual desembarque do governo, parte da sigla ainda vê com ceticismo o movimento ser concretizado no curto prazo. Além do Ministério do Esporte, comandado por André Fufuca (PP-MA), contribuem para a permanência da sigla indicações que rendem dividendos eleitorais, como a Caixa, considerada uma joia sob influência do Centrão, e o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas (Dnocs), órgão responsável por tocar projetos hídricos no Nordeste. A saída da Esplanada tem sido defendida publicamente pelo presidente do partido, o senador Ciro Nogueira (PI), ex-ministro da Casa Civil do governo Bolsonaro.

    No cenário atual, há preocupação de uma ala do PP com a possibilidade de perder o comando do banco estatal, cujo presidente, Carlos Antônio Vieira Fernandes, foi indicado pelo ex-presidente da Câmara Arthur Lira (PP-AL). A Caixa é responsável por gerenciar parte das transferências de recursos da União para os estados, municípios, Distrito Federal, além de ser patrocinador de eventos regionais.

    Uma reunião marcada pela cúpula do partido na próxima semana deve definir os rumos que a sigla deverá seguir. Irá pesar ainda a possibilidade de o PP finalmente selar uma federação com o União Brasil, o que também pode ser definido na semana que vem. Ciro Nogueira tem conversa agendada com o presidente do União Brasil, Antonio Rueda, no domingo.

    Histórico governista

    Desde 1995, quando o antigo PPB foi fundado, a sigla integrou a Esplanada em todos os governos. Passou pelas gestões Fernando Henrique Cardoso, dois mandatos de Luiz Inácio Lula da Silva, Dilma Rousseff, Michel Temer e Jair Bolsonaro. O próprio Bolsonaro é egresso das fileiras da sigla e teve relação próxima com Francisco Dornelles, que a comandou por seis anos.

    O movimento pelo desembarque acontece enquanto há uma discussão sobre reforma ministerial e disputa por espaço entre os partidos. A pressão cresce também diante da queda de popularidade de Lula.

    — Há uma pressão muito forte no partido, os deputados querem a entrega desse ministério (do Esporte), mas ainda não há nada decidido — diz Nogueira.

    Nas últimas semanas, por duas vezes a bancada do PP na Câmara se reuniu e houve pedidos pela saída de Fufuca do ministério. Os apelos foram direcionados ao líder, Dr. Luizinho (RJ).

    Sobre a Caixa, no entanto, nada foi falado. Em público, os parlamentares argumentam que a indicação de Vieira Fernandes foi negociada diretamente por Lula e Lira e não seria afetada por um desembarque.

    — (A decisão do PP) não seria deixar o governo, porque na verdade a gente nunca entrou, não teve benesses para o partido esse Ministério (do Esporte) — disse o deputado Júlio Arcoverde (PP-PI).

    Essa opinião não é compartilhada por todos os integrantes do partido. Há caciques da sigla que se preocupam com a perda dessa influência.

    A indicação de Vieira Fernandes fez parte, em 2023, da longa negociação que selou a aliança do Centrão com o governo. As vice-presidências do banco também entraram na partilha e foram entregues a partidos que apoiavam o então presidente da Câmara.

    O PP tem ainda nomes na diretoria do Sebrae. A ex-deputada federal Margarete Coelho, próxima a Lira, é diretora de administração e finanças da entidade. O PP, no entanto, não considera essa uma indicação da cota do partido, mas da Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA). Há ainda Fernando Marcondes Leão no comando do Dnocs, uma indicação do PP que data do governo Bolsonaro.

    Parlamentares avaliam que o arranjo para a estatal que desenvolve ações contra as secas também é importante para dar visibilidade a quadros da sigla.

    Influência na reforma

    Integrantes de outros partidos veem no movimento do PP uma forma de influenciar as mexidas que o governo ainda pretende fazer. Segundo aliados, Fufuca nega que vá contrariar qualquer decisão do partido, ainda que seja pelo desembarque do governo.

    Ciro Nogueira sempre se posicionou contra a participação da sigla no Executivo e afirmou que a nomeação era uma relação direta entre o parlamentar e o governo. Fufuca é próximo a Nogueira e foi presidente do PP no período em que o senador se afastou da função para chefiar a Casa Civil no governo de Jair Bolsonaro.

    A nomeação do deputado do PP fez parte de uma reforma promovida por Lula em 2023. Na mesma época, Silvio Costa Filho (Republicanos) também tomou posse no Ministério de Portos e Aeroportos.

    Com os seguidos percalços do governo, as cúpulas do União Brasil, PP e PSD buscam se afastar de Lula, com críticas à atual gestão. O União Brasil tem três ministérios no governo Lula, com Celso Sabino no comando do Turismo; Juscelino Filho, nas Comunicações; e com Waldez Góes, que é do PDT, mas foi indicado pelo presidente do Senado, Davi Alcolumbre (União-AP), para Integração e Desenvolvimento Regional. O PSD também tem três, com Alexandre Silveira (Minas e Energia), Carlos Fávaro (Agricultura) e André de Paula (Pesca), embora haja insatisfação com esse último posto.

    A escolha de Gleisi Hoffmann por Lula para ocupar a Secretaria de Relações Institucionais também fez recrudescer a pressão da bancada do PP. A futura ministra tem imagem muito vinculada a uma ala mais radical do PT. Também há críticas, pelo mesmo motivo, à possibilidade de Guilherme Boulos (PSOL-SP) ser indicado à Secretaria-Geral da Presidência no lugar de Márcio Macêdo.

    — Percebo hoje uma insatisfação muito grande. Realmente, o partido precisa fazer uma avaliação mais rigorosa. Até porque, pela indicação da Gleisi e a hipótese da entrada de Guilherme Boulos, (Lula) mostra que o governo está sem rumo — disse o deputado Evair de Melo (PP-ES).

    Ministros, líderes no Congresso e presidentes de partidos do Centrão e até de esquerda avaliam que a nomeação de Gleisi mostra uma tendência de Lula de se fechar ainda mais, com a tendência de tomar decisões mais à esquerda. A postura iria na contramão, por exemplo, da política fiscal mais austera, algo defendido por forças de centro.

    — O que se esperava era que o governo Lula procurasse um apoio do centro. Mas o que ele fez até agora foi uma demonstração de ampliar a parte mais à esquerda do seu governo. Quando fui relator do arcabouço fiscal, existia duas figuras dentro do PT que eram radicalmente contra a responsabilidade fiscal, o ajuste econômico, cortar despesas, que é o atual líder do PT na Câmara, Lindbergh Farias (PT-RJ) e Gleisi — afirmou o deputado Cláudio Cajado (PP-BA).

    O momento mais crítico na aprovação do atual mandato de Lula também fez esfriar planos de uma adesão ainda maior do PP ao governo. Aliados que defendiam a entrada de Lira na gestão petista, no comando de algum ministério, como forma de seguir em evidência, agora veem com menos entusiasmo a possibilidade.

    A bancada do PP aguarda uma definição de Nogueira e ao menos duas possibilidades são levantadas. Uma delas seria uma decisão de que nenhum membro do partido pode fazer parte do governo, o que implicaria na entrega do ministério por parte de Fufuca. Outra é uma resolução que possa ir além disso e influenciar nos votos da bancada na Câmara. Atualmente, o PP tem votado com o governo na pauta econômica. (O Globo)

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