• Dino batiza de ‘emenda pizza’ divisão de recursos no Congresso ao determinar audiência para discutir suposta continuação do orçamento secreto

    O ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), determinou a realização de uma audiência em uma ação que discute o possível descumprimento da decisão que proibiu o chamado orçamento secreto. Devem participar representantes da Câmara, do Senado e do governo federal. A audiência será realizada no início de agosto. Também devem participar representantes da Procuradoria-Geral da República (PGR), do Tribunal de Contas da União (TCU) e do PSOL, autor da ação.

    O ministro Flávio Dino batizou de “emenda pizza” um dos mecanismos que estão sendo utilizados pelo Congresso Nacional e o Palácio do Planalto para substituir o orçamento secreto. Em decisão nesta segunda-feira, 17, Dino convocou uma conciliação entre o Legislativo e o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) para tratar do “cumprimento integral” da decisão da Corte que derrubou o repasse irregular de verbas.

    De acordo com Dino, mesmo com a decisão da Corte, em dezembro de 2022, a distribuição de recursos parlamentares sem transparência continuou ocorrendo entre o Executivo e o Legislativo. O ministro listou que as verbas recebem “embalagens” diferentes da usada no orçamento secreto, sendo elas: “RP 2, RP 8 e “emendas pizza”. O esquema do orçamento secreto foi revelado pelo Estadão.

    “Fica evidenciado que não importa a embalagem ou o rótulo (RP 2, RP 8, “emendas pizza” etc.). A mera mudança de nomenclatura não constitucionaliza uma prática classificada como inconstitucional pelo STF, qual seja, a do ‘orçamento secreto”, afirmou Dino na decisão.

    Essa é a primeira vez que o Judiciário usa o termo “emenda pizza” em decisões sobre emendas parlamentares. O termo sugere que as verbas estão sendo “divididas em fatias” e entregues para os partidos.

    Em abril, Dino, que é o relator do caso, já havia intimado os presidentes da República, do Senado e da Câmara para se manifestarem sobre a questão. O ministro considerou que, com a apresentação das repostas, “fica evidente o interesse dos Poderes Legislativo e Executivo em atender às ordens judiciais”, mas declarou que os fatos “ainda demandam definitivo esclarecimento”.

    Para Dino, ainda “não houve a comprovação cabal” de que a decisão do STF está sendo cumprida, e que todas as práticas viabilizadoras do ‘orçamento secreto’ devem ser definitivamente afastadas”. O ministro acrescentou que “não importa a embalagem ou o rótulo” e “a mera mudança de nomenclatura não constitucionaliza uma prática classificada como inconstitucional pelo STF”.

    O orçamento secreto, que tinha como base as emendas de relator ou RP-9, era o instrumento por meio do qual parlamentares destinavam recursos das União sem serem identificados. Os políticos agraciados com a verba eram escolhidos pelo governo, sem critérios claros de seleção, em troca de apoio no Congresso. Esse mecanismo foi proibido pelo STF em 2022.

    O suposto descumprimento da decisão foi apontado pela associação Contas Abertas, pela Transparência Brasil e pela Transparência Internacional no Brasil. As organizações haviam citado, entre os outros pontos, as chamadas “emendas pix”, nas quais o valor é enviado por parlamentares a prefeituras e estados sem um fim específico.

    Como mostrou o Estadão, o governo, a meses das eleições municipais, segue distribuindo recursos para aliados no Congresso, sem transparência, repetindo mecanismo que marcou a gestão do ex-presidente Jair Bolsonaro.

    “Não há dúvida de que os Poderes Legislativo e Executivo são revestidos de larga discricionariedade quanto ao destino dos recursos orçamentários, o que não exclui o dever de observância aos princípios e procedimentos constantes da Constituição Federal – entre os quais os postulados da publicidade e da eficiência. Sem eles, abrem-se caminhos trevosos conducentes a múltiplas formas de responsabilização, que se busca prevenir com a decisão ora proferida”, escreveu Dino.

    A audiência de conciliação está marcada para às 10 horas do dia 1º de agosto deste ano. Além de Dino, que vai conduzir a reunião, vão participar da oitiva o procurador-geral da República, Paulo Gonet, o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas, o ministro da Advocacia-Geral da União (AGU), Jorge Messias, as chefias das advocacias da Câmara e do Senado e o advogado do PSOL (partido autor da ação que culminou na proibição do orçamento secreto em 2022).

    No despacho desta segunda-feira, Dino afirma que o tema não poderá tratado na mesma ação porque não fazia parte do conteúdo original dela, que era o orçamento secreto.

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