O ministro Flávio Dino, do STF (Supremo Tribunal Federal), afirmou que, “num país ideal, o Supremo não decide tanto”. A declaração foi feita durante audiência pública sobre emendas parlamentares impositivas, realizada das 9h às 17h na sala de sessões da 2ª Turma da Corte.
A audiência, convocada pelo próprio ministro, reúne especialistas e interessados no tema dos recursos de congressistas. A audiência foi organizada para coletar informações técnicas necessárias ao julgamento de diversas ADIs (Ações Diretas de Inconstitucionalidade) que tratam do tema.
Segundo Dino, o excesso de decisões concentradas no STF demonstra um desequilíbrio institucional.
“Temos procurado manter o diálogo entre os Três Poderes porque, certamente, temos hoje um Supremo sobrecarregado. Isso é uma contrautopia. Num país ideal, que é o que todos desejamos, o Supremo não decide tanto, não bate tanto pênalti. Quem bate 10 pênaltis pode errar um; quem bate 100, pode errar 20. A falha é inerente ao ser humano”, disse.
O ministro criticou o acúmulo de processos no STF e citou como exemplo o julgamento, feito pela Corte, sobre o título do Campeonato Brasileiro de 1987.
Em agosto de 2024, Dino rejeitou um recurso da CBF (Confederação Brasileira de Futebol) e manteve a decisão que reconheceu o Sport Club do Recife como campeão daquele ano.
“É falsa a ideia de que desejamos um Supremo sobrecarregado, decidindo pela 2ª vez o campeão brasileiro de 1987. Eu participei desse julgamento. O resultado, como todos sabem, foi a declaração do Sport como campeão. Estamos aqui tratando de temas importantes, como a destinação de recursos públicos, e por isso faço essa saudável provocação”, afirmou.
A fala de Dino foi feita depois da apresentação de Fernando Facury Scaff, professor titular de Direito Financeiro da Faculdade de Direito da USP. Scaff afirmou que a criação de diferentes tipos de emendas impositivas transferiu o eixo de controle orçamentário do Executivo para o Legislativo.
Segundo ele, a atual configuração tem incentivado o uso dos recursos para interesses particulares, em detrimento do bem público. “Os recursos passaram a ter dono. O que era público se tornou privado”, disse.
Dino nega culpa por atraso em emendas
O ministro Flávio Dino, do STF (Supremo Tribunal Federal), rebateu alegações de que a corte é responsável por uma lentidão na execução de emendas parlamentares.
A declaração foi dada em audiência pública chamada pelo ministro para tratar da execução das chamadas emendas impositivas ao Orçamento.
Os presidentes da Câmara dos Deputados, Hugo Motta (Republicanos-PB), e do Senado, Davi Alcolumbre (União Brasil-AP), tinham a presença prevista no encontro e ensaiavam, segundo a Folha mostrou, usar o espaço para dar recados à corte sobre a matéria. Ambos cancelaram, no entanto, a ida já durante o andamento da sessão.
“Quanto a uma suposta lentidão na execução, há uma ideia geral de que isso foi definido exclusivamente pelo Supremo. As exposições lembraram que foi uma conversação de todos os Poderes. É um processo em curso”, disse Dino.
Em ao menos dois momentos durante o evento, o magistrado abordou o tema. Ele negou haver qualquer demora no trato das liberações.
“Foi uma concertação de todos os Poderes que resultou na lei complementar 210, dirigindo o plano de trabalho. Lembrando, portanto, que este novo rito derivou de uma deliberação de todos os Poderes, não só do Supremo”, afirmou.
O controle do Congresso sobre o Orçamento federal foi construído ao longo dos últimos dez anos e é a principal razão do atual empoderamento de deputados e senadores.
As emendas parlamentares somam R$ 50 bilhões ao ano. Desse valor, 77% são de caráter impositivo, ou seja, de execução obrigatória pelo governo.
Ainda na abertura da sessão, o ministro disse que, quando se trata de dinheiro privado, cada um gasta como bem entender, mas a verba é pública, e é preciso atenção às determinações constitucionais.
“O esclarecimento que faço é na suposta lentidão do STF na execução do dinheiro público. Obviamente, quando se trata do direito privado, cada um tem a plena autonomia de gastar onde, na forma, e na velocidade que desejar. No caso do direito público, é claro que existe um devido processo regrado na Constituição. Burocracia é inerente à boa aplicação do direito público. Obviamente pode haver uma complicação nos meios, mas o objeto é a fidelidade à Constituição”, afirmou.
Em 2015, cada deputado e senador tinha sob seu controle R$ 16 milhões, e o governo tinha a possibilidade de não pagar nenhum centavo, se quisesse.
Neste ano, cada deputado indicou R$ 37,3 milhões em emendas individuais, e cada senador, R$ 68,5 milhões. No caso das bancadas, cada estado receberá R$ 528,9 milhões. Agora, o governo é obrigado a executar esses valores.
O aumento estimado total, segundo cálculos do economista Felipe Salto, foi de 700%. De acordo com ele, os problemas são de falta de transparência, ineficiência do uso dos recursos, e uma enorme dificuldade para execução da política fiscal, além do fato de amarrar o Executivo.