• “Nessa hora, até ateu reza”, disse Lula. Veja os bastidores da pane do avião presidencial

    As dezesseis pessoas que estavam a bordo do avião presidencial não demoraram a perceber que algo estava errado. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua comitiva haviam deixado o aeroporto nas redondezas da Cidade do México há cerca de cinco minutos quando um forte estampido foi ouvido.

    A aeronave da Força Aérea Brasileira (FAB) ainda ganhava altitude e não chegara nem a cinco mil pés. Ainda assim, era nítida a sensação de que a decolagem não transcorria como deveria. O barulho seguia alto e constante. O temor foi confirmado pelo comandante que logo avisou: havia um problema e eles estavam analisando o que fazer.

    Percebendo os olhares de apreensão, Lula levantou-se e foi até a cabine. O próprio presidente voltou com o primeiro relato do que se tratava. O barulho que todos ouviam era do motor, onde uma falha havia ocorrido.

    – Nessa hora, até ateu reza – disse Lula ao grupo.

    Em áudio obtido pela Folha de S.Paulo, é possível ouvir o piloto apontar “pan-pan”, como uma forma de indicar pane na aeronave. Na gravação, o responsável pelo voo identifica a aeronave como presidencial do Brasil, indica uma curva e alerta sobre a pane. O termo “pan-pan” indica urgência, seja por um passageiro que necessita de atenção médica, seja por falha em um equipamento, mas não chega a ser tão grave quanto o “mayday”.

    O presidente pediu para que o próprio comandante fosse pessoalmente tranquilizar o grupo, composto pela primeira-dama, Rosângela Silva, ministros e parlamentares. Ele informou então que não havia mais a opção de seguir e era preciso retornar à capital mexicana para trocar de avião. Antes, no entanto, eles teriam de queimar combustível no ar.

    O peso permitido para uma aeronave na decolagem é bem diferente do autorizado para o pouso. Como o avião tinha acabado de deixar o aeroporto e estava com o tanque cheio, havia bastante querosene para gastar. A opção mais segura era ficar nas redondezas do aeroporto, por isso, eles começaram a voar em círculos.

    O fato de não haver turbulência e de Lula ter “tomado à frente” na busca por informações ajudou a conter os ânimos, segundo a senadora Teresa Leitão (PT-PE), que integrava a comitiva. O barulho do motor, porém, ia e voltava, como um lembrete constante de que algo estava errado.

    As duas horas estimadas inicialmente pelos pilotos nessa rota improvisada perto do aeroporto viraram quatro horas e meia. Com isso, a tensão e a irritação de alguns aumentou. Janja ”estava aperreada”, mas mantendo a tranquilidade, conta a senadora.

    – Todos ficaram mais contidos porque não tinha o que fazer. Alguns devem ter rezado. Eu sei que eu rezei – diz Leitão.

    Os celulares estavam funcionando, o que foi um refúgio e uma forma de alguns camuflarem a tensão. Um dos presentes conta que, na presença do presidente não demonstrou, mas por mensagens durante o voo admitia a pessoas próximas a enorme preocupação.

    Por volta das 22h, o comandante avisou que iniciariam os procedimentos de decida. O pouso transcorreu de forma tranquila, sem trepidações ou sobressaltos, para alívio de Lula e seu grupo.

    Lula reclama

    A pane no avião oficial da Presidência da República não causou medo, mas uma grande irritação no presidente Lula (PT). Ele reclamou da conectividade instável da aeronave em um momento como aquele, segundo apurou o Estadão. De acordo com aliados, Lula considera o modelo comprado há 18 anos antiquado e voltou a considerar a sua substituição. Segundo relatos, ao final do voo, o presidente ressaltou que era preciso pensar sobre a segurança das aeronaves.

    Assustada com a falha técnica em uma turbina, fato que obrigou o avião a dar voltas por cinco horas para queimar combustível, a primeira-dama Janja da Silva chegou a defender que a delegação passasse mais uma noite na Cidade do México. Lula, porém, discordou. A decisão do presidente foi de que todos deveriam embarcar ainda naquela noite na aeronave reserva que os esperava no aeroporto.

    Tudo começou com um forte estrondo. Assustado, o presidente se levantou e foi pessoalmente à cabine de comando. Foi informado de que, provavelmente, teria havido uma colisão com um pássaro que comprometera uma das turbinas. O próprio Lula tratou de tranquilizar a comitiva presidencial. O comandante fez seu pronunciamento em seguida e assegurou que o pouso só seria feito em níveis seguros de abastecimento.

    Inicialmente, a previsão era de ficar no ar por duas horas. Quando o prazo estava quase acabando, o piloto deu novo informe. Desta vez, disse que só pousariam depois de quatro horas, para queimar o combustível e garantir o nível de segurança para descer.

    Além de Lula e Janja, estavam a bordo os ministros Mauro Vieira (Relações Exteriores) e Cida Gonçalves (Mulheres); o diretor-geral da Polícia Federal, Andrei Rodrigues; o diretor de Política Monetária do Banco Central, Gabriel Galípolo, indicado para a presidência da autarquia; as senadoras Soraya Thronicke (União-MS) e Teresa Leitão (PT-PE); o fotógrafo oficial de Lula, Ricardo Stuckert; o secretário de imprensa, José Chrispiniano; o assessor especial Audo Faleiro, da equipe de Celso Amorim; e mais três auxiliares da Secretaria de Imprensa (Secom).

    A tensão no AeroLula resgatou, dentro do governo, as discussões sobre comprar um novo avião presidencial ou reformar unidades em posse da Força Aérea Brasileira (FAB). O ex-presidente Jair Bolsonaro comprou aeronaves da companhia Azul, mas os modelos precisam ser adaptados para uso presidencial, uma reforma cara e que pode custar pontos na popularidade do presidente, alertam auxiliares.

    O ministro da Defesa, José Múcio Monteiro, antecipou o fim de suas férias e está em trânsito dos Estados Unidos para o Brasil. Ao chegar, terá uma reunião com Lula e o comandante da Aeronáutica, brigadeiro Damasceno, para discutir o assunto.

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