A operação da Polícia Federal deflagrada nesta terça-feira (19) apresenta, com riqueza de detalhes, como os militares das Forças Especiais utilizaram técnicas avançadas do treinamento militar para tentar executar ações como a captura e o assassinato do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes. Chegaram a colocar em prática um dos planos, posicionando militares perto da casa do ministro, mas cancelaram de última hora a ação.
A PF cumpriu a prisão de quatro militares das Forças Especiais, também conhecidos como “kids pretos”: o general da reserva Mário Fernandes e os tenentes-coronéis Hélio Ferreira Lima, Rafael Martins de Oliveira e Rodrigo Bezerra de Azevedo.
O treinamento dos membros das Forças Especiais inclui táticas de guerrilha, ações de inteligência, infiltração em territórios inimigos e ações para desestabilizar adversários.
A investigação da Polícia Federal detectou que essas técnicas foram empregadas nas ações que iriam resultar no assassinato de Moraes, no dia 15 de dezembro de 2022, em Brasília.
“Os dados obtidos demonstram que militares, em perceptível integração criminosa, planejaram e executaram uma operação clandestina com emprego de técnicas típicas de agentes de forças especiais”, escreveu a PF no pedido de prisão.
O emprego de técnicas militares teve início nas reuniões para o planejamento das ações golpistas e a criação de um documento com o nome “Copa 2022”, que descrevia o planejamento.
As ações começaram a ser colocadas em prática com a aquisição de aparelhos celulares novos registrados em nome de terceiros e o uso de codinomes em um aplicativo de mensagens, para que os militares se comunicassem durante a execução das ações.
Em vez de cadastrarem seus nomes no aplicativo, eles usaram nomes de países como codinomes: Alemanha, Áustria, Gana, Japão.
A PF diz que seis militares das Forças Especiais atuaram na tentativa de assassinato de Moraes no dia 15 de dezembro de 2022 e que um dos líderes era o tenente-coronel Rafael Martins. Nessa data, todos combinaram posicionamentos específicos em Brasília. Usaram veículos alugados para tentar não deixar rastro. Havia militares próximos ao STF e outros em uma localidade a poucos quilômetros da residência do ministro.
Um imprevisto, entretanto, resultou na mudança do plano naquele dia. Um julgamento que ocorria no STF foi encerrado mais cedo do que o previsto. Diante dessa notícia, os kids pretos trocaram mensagens sobre o assunto por meio do aplicativo.
Áustria pergunta: “Tô perto da posição, vai cancelar o jogo?”. Outro integrante responde e distribui tarefas: “Abortar… Áustria… Vai para local de desembarque… Estamos aqui ainda. Gana… prossegue para resgate com Japão”.
A PF detectou que o militar situado próximo à residência do ministro Alexandre de Moraes optou por deixar o local a pé, sem pedir táxi ou algum meio de transporte, para evitar deixar qualquer tipo de rastro.
Na conversa, o tenente-coronel Rafael Martins diz aos colegas que era o momento de “exfiltração”. A própria PF traduz o termo em sua representação por meio de um glossário do Exército: “Técnica de movimento realizado de modo sigiloso com a finalidade de retirar forças, pessoal isolado ou material do interior de território inimigo ou por ele controlado”.
O grupo também fez deslocamentos em outros dias para locais próximos ao STF e à residência do ministro, com o objetivo de monitorá-lo para uma eventual execução.
A PF também detectou que esses militares atuaram para disseminar notícias falsas sobre as urnas eletrônicas e lançar dúvidas sobre o resultado do pleito, em uma outra tentativa de usar técnicas militares de “ações psicológicas” para tornar o ambiente propício a um golpe.
“Esse modo de atuação foi robustecido pelo emprego de técnicas de ações psicológicas e propaganda estratégica no ambiente politicamente sensível pelo “Kids Pretos”, instigando, auxiliando e direcionando líderes das manifestações antidemocráticas conforme seus interesses”, escreveu a PF.
Documento juntado aos autos pela PF descreve a possibilidade de envenenamento para assassinar o presidente Lula.
O plano previa ‘neutralizar” o presidente e o vice Geraldo Alckmin com envenenamento e uso de componentes químicos que pudessem causar um “colapso orgânico” sobre Lula.
De acordo com esses planos, o assassinato de Lula ocorreria no dia 15 de dezembro de 2022, logo após a diplomação do presidente eleito pelo Tribunal Superior Eleitoral.
As defesas dos alvos citados não se manifestaram sobre a investigação até o momento. (UOL)