O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes determinou que o presidente Jair Bolsonaro compareça pessoalmente à Superintendência da Polícia Federal no Distrito Federal na sexta-feira, às 14h, para prestar depoimento sobre suspeita de vazamento de documentos sigilosos de uma investigação da PF.
A decisão do ministro foi em resposta a um pedido da Advocacia-Geral da União (AGU) para que Bolsonaro não comparecesse ao depoimento, cujo prazo venceria nesta sexta-feira, dia 28. O presidente teria a prerrogativa de escolher data, horário e local para o interrogatório, mas a AGU apenas apresentou, na véspera do fim do prazo, um pedido de dispensa. Por isso, Moraes negou o pedido e determinou o comparecimento pessoal à PF para o depoimento.
“Em momento algum, a imprescindibilidade do absoluto respeito ao direito ao silêncio e ao privilégio da não autoincrimnação constitui obstáculo intransponível à obrigatoriedade de participação dos investigados nos legítimos atos de persecução penal estatal ou mesmo uma autorização para que possam ditar a realização de atos procedimentais ou o encerramento da investigação, sem o respeito ao devido processo legal”, escreveu Moraes.
Prosseguiu o ministro: “Em uma República, o investigado – qualquer que seja ele – está normalmente sujeito ao alcance dos poderes compulsórios do Estado necessários para assegurar a confiabilidade da evidência, podendo, se preciso, submeter-se à busca de sua pessoa ou propriedade, dar suas impressões digitais quando autorizado em lei e ser intimado para interrogatório”.
Segundo Moraes, embora a lei preveja que caberá ao investigado escolher o “direito de falar no momento adequado” ou o “direito ao silêncio parcial ou total”, “não é o investigado que decidirá prévia e genericamente pela possibilidade ou não da realização de atos procedimentais ou processuais durante a investigação criminal ou a instrução processual penal”.
Esse inquérito foi aberto para apurar a suspeita de vazamento de documentos sigilosos de uma investigação da PF a respeito de ataque hacker ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). O inquérito foi aberto pelo Supremo e tramita sob relatoria de Moraes.
Bolsonaro divulgou os documentos em sua rede social e também durante uma transmissão ao vivo em julho na qual divulgou informações falsas a respeito da confiabilidade das urnas eletrônicas. O presidente, então, mostrou documentos de uma investigação da PF sobre ataque ao TSE, mas que não tinha nenhuma relação com as urnas eletrônicas. O deputado bolsonarista Filipe Barros (PSL-PR), que participou da live, também é investigado.
A divulgação de documentos sigilosos constitui crime, por isso o STF abriu inquérito para apurar a conduta do presidente. O depoimento de Bolsonaro é uma das últimas diligências pendentes para a PF concluir a investigação.
Na sua petição, a AGU também pediu o arquivamento do inquérito e citou trechos do depoimento do delegado Victor Campos, que era responsável pela investigação sobre o ataque hacker ao TSE. O delegado afirmou que essa investigação não estava sob segredo de Justiça e que, por isso, forneceu cópia dela para o deputado Filipe Barros após uma solicitação do parlamentar à Superintendência.
Em novembro, Bolsonaro prestou depoimento em um outro inquérito, sobre suspeita de interferência indevida na Polícia Federal. Neste caso, ele foi ouvido no próprio Palácio do Planalto pela equipe da corporação. Inicialmente, Bolsonaro também tentou ser dispensado do depoimento, mas mudou de posicionamento e concordou em ser ouvido pela PF.
Em dezembro, a Polícia Federal chegou a intimar Bolsonaro a prestar depoimento. Por ser presidente da República, ele tem a prerrogativa de escolher data, horário e local para o seu depoimento. Por isso, o agendamento dependia de uma resposta do Palácio do Planalto à polícia.
Mesmo com a determinação do ministro do STF, há a possibilidade de que o presidente não compareça à Polícia Federal. Juristas ouvidos pelo GLOBO explicam que, por ser investigado, e não testemunha, Bolsonaro não é obrigado a depor — prestar depoimento como investigado é um ato de defesa e, portanto, a pessoa se defende se quiser.
— Mas como existe uma ordem judicial para que Bolsonaro vá, caso ele não compareça estará, sim, descumprindo uma ordem judicial — pondera Thiago Bottino, professor da FGV Direito Rio.
Uma hipótese que, caso seja concretizada, poderia levar, em tese, ao cometimento de crime de responsabilidade por parte do presidente. No STF, a expectativa é que Moraes, em caso de falta por parte de Bolsonaro, analise quais medidas adotar. O Globo