O Globo – Um vídeo gravado pela Polícia Federal (PF) no escritório do deputado Josimar Maranhãozinho (PL-MA), flagrado com uma caixa de dinheiro, mostra o parlamentar contando que Valdemar cumpriu um acordo e deu R$ 9 milhões durante as eleições municipais de 2020. “Valdemar”, segundos os investigadores, seria Valdemar Costa Neto, presidente do PL, partido que abrigou recentemente o presidente Jair Bolsonaro.
A gravação feita por meio de uma câmera escondida faz parte de uma ação controlada da Polícia Federal, autorizada pelo Supremo Tribunal Federal (STF), para apurar se Maranhãozinho desviou verba de emenda parlamentar. Em uma das filmagens, realizada no dia 27 de outubro de 2020, uma pessoa não identificada questionou o parlamentar:
— Mas está pronta a campanha, né…
Maranhãozinho, então, respondeu:
— Valdemar cumpriu certinho comigo (…) Sim, 9 milhões ele me deu.
Maranhãozinho já era deputado federal e não concorreu a nenhum cargo naquele ano. Presidente do diretório do PL no Maranhão, o parlamentar apoiava dezenas de prefeitos do seu partido no estado.
Procurado, o deputado não explicou a origem dos R$ 9 milhões que teria recebido de “Valdemar” nem negou a referência ao presidente do PL. Por meio de nota enviada por sua defesa, o parlamentar disse que “os vídeos foram criminosamente vazados, sendo que, neste caso, foram pinçados trechos para distorcer a verdade dos fatos” e afirmou que se “colocou à disposição dos órgãos investigativos”.
Já Valdemar Costa Neto alegou que os recursos foram destinados a Maranhãozinho, porque ele comanda o partido no Maranhão e é o responsável por distribuir os recursos do fundo eleitoral aos prefeitos do estado. O presidente do PL encaminhou à reportagem uma planilha que relaciona as transferências do partido às campanhas dos candidatos do Maranhão em 2020. O documento aponta repasses que totalizam R$ 13,5 milhões. No entanto, segundo o arquivo, apenas R$ 4,9 milhões haviam sido transferidos até 27 de outubro de 2020, quando Maranhãozinho foi flagrado pela PF dizendo que teria recebido R$ 9 milhões do chefe da legenda.
Em outra gravação, realizada em 21 de outubro, Maranhãozinho participa de uma reunião em que é questionado por um assessor sobre como resolver uma questão de marketing de uma campanha eleitoral. O deputado, então, respondeu:
— Eu tenho…eu tenho…em espécie, agora, eu tenho duzentos. Aí, eu posso viabilizar pra ver se eu consigo sacar. Porque não dá para usar nota, aí, então, tem que pagar por fora mesmo — afirmou o parlamentar na gravação.
A PF destaca que esse trecho do vídeo reúne “indícios” de que aquela não foi a primeira entrega de valores em espécie feita por Maranhãozinho. Uma gravação revelada pelo GLOBO mostra o parlamentar entregando uma caixa de dinheiro que, segundo ele, teria R$ 250 mil.
Procurado para comentar as gravações, o gabinete do deputado alegou, em nota, que as imagens retratam a “atividade empresarial na pecuária com compra e venda de gado e equipamentos” e que o parlamentar é alvo de “perseguição política”.
‘A caixa secou’
No vídeo gravado pela PF em 27 de outubro de 2020, Maranhãozinho e seu aliado também falam sobre como organizam as finanças das campanhas. Em certo momento, o deputado faz um alerta para o seu interlocutor não gastar o dinheiro com “besteira”. Ao ouvir o conselho do parlamentar, a pessoa não identificada contou que guardou o dinheiro em uma caixa no quarto de seu pai, mas os recursos “secaram”.
— Cheguei lá em casa para encontrar 480 mil (inteligível). Estava no quarto de meu pai numa caixa. Ele toda hora pega. Quando foi ontem, foi ontem.. eu falei pai, vim aqui pegar aqui. Ele falou, meu filho a caixa secou aqui… — afirmou, aos risos.
O esquema
Segundo a Polícia Federal, o esquema de desvio de dinheiro teria começado em abril de 2020, quando o deputado alocou R$ 15 milhões em emendas parlamentares destinadas à área da saúde para diversas prefeituras do Maranhão. Alguns dos municípios beneficiados contrataram, inclusive com dispensa de licitação, empresas que, de acordo os investigadores, possuem vínculos com Maraonhãozinho.
Relatórios do Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), órgão de combate à lavagem de dinheiro, identificaram “vultuosos saques” nas contas das firmas ligadas ao deputado. Uma delas é a Medshop, que recebeu R$ 3,9 milhões por meio dos fundos de saúde de cinco municípios. Após esses repasses, entre junho e agosto de 2020, foram feitos 13 saques em espécie das contas da empresa no valor total de R$ 3,1 milhões.
A partir dessas movimentações financeiras, a PF decidiu seguir os passos das pessoas responsáveis por realizar os saques nos nomes das empresas. Durante a vigilância, os policias descobriram que os suspeitos saíam do banco e se dirigiam a um escritório de Maraonhãozinho, onde os investigadores gravaram, com autorização judicial, o deputado entregando caixa de dinheiro.
Diante das provas colhidas ao longo da investigação, a PF chegou a pedir a prisão do parlamentar, apontando que ele descumpriu uma das medidas cautelares que o impedia de manter contato com outros investigados. Mas o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal, negou o pedido sob argumento de que a Constituição permite a prisão de parlamentares apenas em casos de flagrante delito de crime inafiançável.
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